sábado, 8 de dezembro de 2007

Carter Hotel @ radiozero.pt 09.12.2007 2200h


Arthur Rimbaud
O futuro como objecto poético


“O meu destino depende deste livro”, terá dito Arthur Rimbaud enquanto escrevia o seu “nigger book” (Une Saison en Enfer).Esta afirmação, tão levianamente profunda, moldou o próprio destino e a própria essência da linguagem poética.


O poeta como oráculo de uma determinada sociedade em uma determinada época sempre foi uma imagem recorrente da literatura e mesmo da civilização humana. As palavras de Rimbaud tornaram-se assim e sem mesmo ele se dar conta, num presságio societário incorporado numa tragicidade individual, resultado do expoente civilizacional a que chegámos.


Teremos nós, e desde a partida, o nosso destino traçado ou somos mestres dele próprio? Édipo ao sair de Corinto, ao ouvir as revelações do oráculo, não fez mais que tentar fugir do destino que. o esperava em Tebas. Não será que, a partir de determinado momento todos nós nos apercebemos do nosso destino?


Penso e sinto que sim. A renúncia ao nosso mundo civilizado pela antevisão de um destino trágico é algo de problemático, pois teremos sempre a tendência para a redefinição desse mesmo destino e para a reconstrução do mundo e da sociedade. Rimbaud renunciou a um mundo em apogeu civilizacional; considerava-se no nadir desse mundo. intemporalidade.


Nesta sociedade materialmente científica, ignoramos cada vez mais a voz do futuro, o verdadeiro oráculo, a voz do poeta e da beleza.Em vez disso damos mais atenção à voz do cientista e do horrível. Será então a poesia apenas uma anomalia?


Que fazer perante esta aberração? Acreditar e acreditar sempre. A grande crise existencial de Rimbaud foi quando tinha dezoito anos e a partir daí nada mais escreveu, isolando-se da civilização e do mundo num deserto inóspito até morrer aos 37 anos.


Consideramos assim que o demónio tomou conta da literatura e da poesia? Criámos monstros ou somos nós o verdadeiro Monstro. Rimbaud caminhou sozinho por toda a Europa, esfomeado, durante dois anos numa experiência única que muito contribuiu para a sua visão do mundo e da particularidade e singularidade das coisas simples.


Vivemos numa era em que definitivamente temos de aceitar o Demónio como símbolo da pequenez existencial dos teledependentes, escravos absolutos de uma máquina castradora.


O elemento que falta em Rimbaud é definitivamente a falta de fé – em Deus, no Homem e na Arte. Somos assim renegados numa civilização já renegada à muito. O regresso ao Bem e ao Belo é sempre possível. No fim, e como em tudo, o que resta somos nós, o Ser Humano. Esta é a verdadeira consciência do poeta e do artista em geral e a verdadeira essência da modernidade.Rimbaud iniciou a modernidade ao abrir novas portas de compreensão de uma realidade cada vez mais complexa e distante do indivíduo. “éternité,infini,charité,solitude,angoisse,lumiére,aube,soleil,amour,beauté,inoui,pitié, démon, ange, ivresse, paradis, enfer » Estas palavras foram de uma maneira obsessiva utilizadas por Rimbaud.


Liberdade de preservação da individualidade, este é o verdadeiro caminho para a Salvação referida tantas vezes por Rimbaud. A ilusão do ser e do conhecimento fizeram de Rimbaud a essência do poeta, sendo hoje comummente aceite como o poeta mais lido e mais actual de todos os tempos. Terrível ilusão esta que nos envolve como um barco bêbado que transporta a mensagem para o grande oceano do conhecimento.


Os símbolos de Rimbaud eram os do espírito, gravados em sangue e angústia. A sua linguagem era a do espírito. A modernidade tinha começado nesse momento.


“ Il faut être absolument moderne ! »


Sons De:

Mercury Rev


Jim O´Rourke

Madrugada

Jim Morrison

Jeff Buckley

Camille

Poemas de "Poesies", "Illuminations" e " Une Saison en Enfer"

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