sábado, 2 de junho de 2007

A desconstrução segundo Jacques Derrida

« Raça curiosa da vida alheia, tarda em corrigir a própria. Mas porque querem saber de mim, quem sou eu, se não querem saber de ti, quem são eles? E como fazem para saber se digo a verdade quando me ouvem falar de mim próprio, quando não há homem que saiba o que se passa dentro de um homem, a não ser o espírito do homem que está dentro dele.»

Agostinho, Confissões

Sendo a desconstrução um processo abstracto mas real, esta é essencialmente uma busca contínua perante a impossibilidade do sistema. Em cada um, a desconstrução surge como força de deslocamento e um limite à própria totalização do sistema.

De facto, foi essa própria incapacidade circular do sistema que permitiu aos filósofos falar em sistema.

Por natureza o sistema não funciona e pela desconstrução, enquanto processo de trabalho e análise, somos levados à disfuncionalidade do próprio sistema e ao desejo de sistema enquanto análise de relações de desajustamento.

D´ailleurs, Derrida

O nomadismo é uma verdadeira estética do exílio enquanto desconstrução da própria origem.

Sendo assim, o único lugar nómada é o lugar de origem. De resto a locomoção dos lugares, dos lugares inscritos na nossa memória é uma questão central no pensamento de Derrida.

Sendo os lugares em nós inscritos, a essência do nosso próprio Eu, a sua não nomeação induz a uma inscrição indizível e a registos muito para além do Ser, do Eu.

São os segredos da singularidade, o gosto do segredo numa hiperradicalização do pensamento, ou seja, a génese da verdadeira desconstrução.

Que limites então para o segredo enquanto processo de identificação?

O Ser " plus qu´un" coloca problemas ao nível da inscrição individual. O pensamento torna-se elíptico e sem interrupção, o som é silêncio e a imagem um regresso constante.

É o domínio da Invisibilidade que justifica e potencializa a dimensão hiperbólica do pensamento de Derrida.

Será que estamos perante um verdadeiro pensamento filosófico?

Aqui, a singularidade toma o lugar de uma identidade e por sua vez a radicalidade induz ao mistério e estranheza, conceitos mais próximos do literário do que do filosófico. É a impossível singularidade da identificação.

Mais do que filosófico, é um conceito de excesso filosófico, ultrapassando os cânones.

Os registos e impressões tocam novamente a literatura, no que ela tem de não canónico e não filosófico.

A imaginação é assim, mais do que um recurso de forma, uma ameaça para a verdade e para as ideias.

Pablo Picasso lembrou-nos que a imaginação é memória e que sendo assim (e é assim!), o lugar de inscrição é o da ficção.

Assim a ficção é um limbo de mediação, sendo aquilo que é e não é, ou que pode ser sem o ser; estamos perante os condicionalismos da dialéctica hegeliana e cuja não linearidade (ou será não circularidade?) resiste à participação e ao sistema enquanto identidade heterogénea que não se fecha.

A desconstrução só é então possível pela impossibilidade do sistema em se resolver e mesmo em existir.

Estamos sempre no "para além do lugar", "ailleurs", aliás também, numa singularidade cultivada que interrompe o registo da possibilidade.

É a inscrição que não se dilui e que através da metáfora, a escrita surge no lugar da ferida. É a dimensão catastrófica do pensamento de Jacques Derrida.

Filmografia

FATHY, Safaa; (1999): "D´ailleurs,Derrida"


















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